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segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Cai a Chuva

Cai a Chuva


Da varanda, refastelado numa rede, olhava o movimento. Olhava o movimento que ninguém notava, ou prestava atenção. Que não parecia interessar ou despertar curiosidade a ninguém.

A chuva caía torrencialmente, forte e barulhenta. Suas gotas ao vento, como que dançavam harmoniosamente num ritmo acelerado, vigoroso, cadenciado. Uma mistura de salsa com bolero, acompanhada por vigorosas rajadas de ventos e fortes trovoadas! Os relâmpagos somavam-se a esses elementos e juntos compunham um belo espetáculo. Mas só eu o contemplava.

No balançar da rede podia sentir o frescor de algumas gotas mais finas que o vento empurrava varanda adentro. Com elas o cheiro da grama e terra molhadas me inebriava, remetendo-me às memórias dos tempos juvenis.

No colo um livro fechado, protegido dos pingos da chuva, aguardava sua hora. Era o motivo inicial de me ter ido à rede, mas fora esquecido momentaneamente, deixado de lado, num ostracismo pertinente à cena daquele dilúvio.

Dentro de casa todos faziam algo mais interessante; -pra eles- uns à frente da TV, - a maioria- outros do computador, e outro diante do vídeo game. Todos com olhos fixos em telas que lhes proporcionavam de alguma forma um entretenimento direcionado, rotineiro. Todos tão perto e ao mesmo tempo tão distantes uns dos outros.

A chuva caía agora mais forte, de alguma forma o ritmo agora era outro, as gotas trocaram o molejo latino por compassos germânicos, poderiam bem estar sendo regidas por Richard Wagner como em Cavalgada das Valquírias, uma ópera a céu aberto.

Da rede, solitário; sereno e encantado com aquele espetáculo da natureza, não podia mais ver muita coisa, a cortina d’água agora embaçava a visão poucos centímetros à frente. Apenas os vultos das árvores, com suas copas festejando o banho que removia a fuligem e outros elementos poluentes emitidos pelos homens.



Então como que pedindo a atenção que lhe era devido, e estava lhe sendo negligenciado, aquele espetáculo irrompeu em trovões contínuos e luminescentes. Em seguida o blackout total, e um muxoxo em coro viera do interior da casa.

A rede balançava ritmadamente, o cheiro da chuva fresca me envolvia e em minha mente associações a um chocolate quente começavam a se formar. Contemplava, mas agora não mais só. Todos vieram à varanda, despertos de suas hipnóticas rotinas. Desprovidos de suas telas, pareciam ter descoberto algo novo, e ali ficaram contemplando a canção da chuva.

A chuva voltou a serenar, e todos parados, apenas a olhavam, distantes. Mas não eu. Saí, e debaixo de chuva caminhei saboreando aquele frescor. Descalço, encharcado e despreocupadamente apenas caminhei.

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